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segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Reportagem da Veja: Governadores na fila da degola


Por Expedito Filho

Em algumas regiões do Brasil, as eleições sempre foram disputadas seguindo regras muito parecidas com as do vale-tudo – incluindo até os golpes abaixo da linha da cintura. À margem da lei, candidatos distribuem favores, usam a máquina pública em benefício próprio, fazem propaganda fora do prazo legal, promovem shows, entregam brindes, financiam consultas médicas, dão comida e, os mais ousados, chegam a entregar cheques pré-datados e dinheiro vivo aos eleitores. O horizonte de impunidade sempre incentivou tais práticas, que não distinguem partidos, credos ou ideologias. A boa notícia é que a tolerância jurídica com esse tipo de comportamento criminoso e antidemocrático dá sinais de arrefecimento. No próximo ano, nada menos que oito governadores correm o risco de ter o mandato cassado por crimes diversos praticados nas eleições de 2006. O que chama atenção é a possibilidade real do encontro de muitos deles com a punição.

Há um mês, o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima, do PSDB, teve o mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral por crime de abuso de poder econômico. O governador, que concorreu à reeleição, foi acusado de distribuir aos eleitores 35 000 cheques de uma fundação estatal durante a campanha. Cunha Lima impetrou um recurso no tribunal para tentar reverter a decisão, mas a chance de sucesso, segundo os ministros, é mínima. Na última quinta-feira 18, foi a vez do governador do Maranhão, Jackson Lago, do PDT, tido como um ícone do combate ao domínio da família do ex-presidente Sarney no estado. Ele foi acusado pelos adversários, entre outras coisas, de ter a candidatura turbinada pelo antecessor, José Reinaldo Tavares, que assinou convênios bem populares com prefeituras durante o período eleitoral. O ministro Eros Grau, relator do processo, votou pela cassação, mas o caso só vai ter um desfecho em fevereiro do ano que vem, depois das férias do Judiciário, devido a um pedido de vista do ministro Felix Fischer.

Sob o comando do ministro Carlos Ayres Britto, o TSE imprimiu um ritmo mais célere aos julgamentos de processos de fraude e corrupção eleitorais. De julho até a semana passada, o tribunal julgou mais de 6.000 ações. Antes não eram incomuns casos que chegavam à corte para ser analisados depois que os investigados já haviam até cumprido o mandato – o que os tornava sem efeito. Um exemplo dessa disposição aconteceu na última quarta-feira 17, durante o julgamento do recurso do governador da Paraíba. O caso está no tribunal há dezoito meses. Apesar disso, na hora de votar, o ministro Arnaldo Versiani pediu vista por 48 horas. Com as férias, portanto, a decisão final só ocorreria em 2009. Irritado, o ministro Joaquim Barbosa abandonou o plenário da corte. Para acalmar os ânimos, Ayres Britto marcou uma sessão extraordinária para dois dias depois, na sexta-feira, quando esperava concluir o julgamento. O ministro Versiani, porém, não conseguiu terminar a tempo a análise dos mais de 500 volumes do processo. O resultado só será conhecido mesmo no ano que vem.
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Apesar de atrasar em pelo menos dois meses a decisão final de cada caso, o adiamento dos julgamentos dos governadores para o ano que vem foi bem recebido por alguns dos interessados diretos no processo. Se a cassação fosse confirmada antes de se completar a metade do mandato, haveria uma nova eleição, como determina a lei. A partir de agora, em caso de perda de mandato, assume o cargo o segundo colocado no pleito anterior.
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Na fila de espera estão figuras que, no passado, também já tiveram problemas sérios com a Justiça, inclusive a eleitoral. No Maranhão, a principal beneficiada seria a senadora Roseana Sarney. No Tocantins, o não menos conhecido Siqueira Campos sonha em voltar mais uma vez ao governo. “O ramo da Justiça mais célere tem de ser o eleitoral, pois temos eleições de dois em dois anos”, disse o ministro Carlos Ayres Britto. Segundo ele, os oito governadores não foram julgados antes porque houve uma mudança de jurisprudência que exigiu que seus vices também fossem incluídos nos processos. Isso fez com que os processos originais retornassem aos tribunais para ser refeitos.

Numa demonstração do aperfeiçoamento das instituições diante de uma legislação mais rigorosa e clara, na semana passada o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, confirmou também a cassação do deputado Walter Brito Neto, do PRB da Paraíba, o primeiro parlamentar a perder o mandato por infidelidade partidária. O processo chegou a criar um mal-estar entre o TSE e a Câmara. Em março, o tribunal cassou o deputado, que, depois de eleito, trocou o DEM pelo PRB, o que é proibido pela legislação. Apesar da decisão, Chinaglia, alegando cautela, preferiu esperar a confirmação de um recurso que o parlamentar impetrou no Supremo Tribunal Federal e que só foi julgado no início de dezembro. A vaga de Walter Brito será assumida pelo suplente Major Fábio. Em 2009, o Tribunal Eleitoral vai analisar outros seis casos de troca de partido, que também podem acabar em cassação de mandato.

A nova atitude dos juízes eleitorais está provocando arrepios em alguns candidatos que temem a possibilidade de o rigor do TSE produzir um efeito colateral perigoso: o candidato especialista em vencer no tribunal. Essa tese, porém, só se sustenta na possibilidade de considerar que nada vai mudar, que os políticos continuarão promovendo as maracutaias de sempre, dando de ombros para a Justiça. Não é esse o quadro que se apresenta. Nas eleições de 2000, foram impetradas 3.000 ações que tentavam impugnar candidaturas ou cassar diplomas. Esse número dobrou. Além dos governadores e dos deputados infiéis, o tribunal cassou 100 prefeitos só neste ano. Um deles por não ter pago uma multa de 3,51 reais. Resume o jurista e ex-ministro do TSE Fernando Neves: “Há um apelo maior ao Judiciário. É esse o movimento. O eleitor quer o cidadão de bem como candidato, e as pessoas viram na Justiça Eleitoral um ponto de segurança para afastar aquele que não honrou o eleitor”.

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